quinta-feira, 25 de agosto de 2011

Espera

Oito horas.
Há duas que te espero, nesta cadeira gelada. Há muito que a esplanada fechou e o calor do chá que esperava pedir, me arrefeceu. Espero-te, ainda.

Contemplo os ponteiros parados do meu velho relógio, cujas pilhas desistiram de te esperar. Resisti-lhes. Não me dou facilmente por vencido. Agora que penso, nem por isso me dou por vencedor. Estou, algures, num meio termo, sem termo certo. Existo, no espaço em que te espero. Ainda.

Ocupo o olhar com a lua vazia e as mãos com o meu velho canivete de bolso. Aquele que me deste, ainda criança, nas traseiras do celeiro da Vó Felismina. Trago-o comigo desde esse dia, já lá vão quase 3 anos. Recordo-me ainda como se fosse hoje, embora já tenha sido antes de ontem. Espero-te. Ainda.

Para ajudar a passar o tempo, imagino-nos um diálogo mudo, em que esgrimimos argumentos, plenos de razão, desprovidos de quase toda e qualquer emoção. Mesmo fruto da minha imaginação, saio vencido nesta aguerrida troca de silêncios. Talvez te deixe vencer. Talvez não te consiga ganhar.

Há mais de duas horas que te espero.
Só vou esperar mais dez minutos. No máximo, até que o ponteiro grande do meu relógio chegue ao cinco...

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

Ar

Roubas-me o ar...

Sorves o espaço que me ocupas e relegas-me para um segundo plano de mim, paredes meias com os meus fantasmas, os teus receios e os nossos velhos livros, ali, naquela velha prateleira empoeirada.
Tiras-me o sono, que trocas por receios fundados de insolvência mental e delírios vazios de razões fartos. Aceno-te com a cabeça, em sinal de anuência fingida. Finges não reparar. Finjo não me preocupar.

Devolve-me o ar. Faz-me falta.
Nunca me dei bem a suster a respiração debaixo de chuva...

sábado, 13 de agosto de 2011

Ilusão

Pinto-me um céu de azul prateado
Rasgado por nuvens laranja-limão.
Pinto-me prados e relva de verão,
Árvores e flores de um negro azulado.

Pinto-me mares e rios e um lago gelado,
Montanhas e vales traçados no chão.
Pinto-me cheiros e cores, de sim e de não,
Palavras e gestos de um silêncio apagado.

Desenho-me um mundo de cor ilustrado,
Com traço e espaço de acesa ilusão,
Com vida inquieta de desejo marcado.

Desenho-te em mim, na palma da mão,
Perfeita candura de um doce pecado:
Pinto-me um sonho... numa bola de sabão!

sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Escultura

Rasga-se-me a pele dos dedos, à custa de esculpir sonhos em madeira-pedra. Turva-se-me a visão, agastada pelas noites não dormidas na atenção ao pormenor de uma incessante busca por uma utópica perfeição. Cansam-se-me os braços, pesados, caídos, impotentes para suster o martelo e o cinzel que me aguilhoam. As pernas, mortas, inertes, sucubem ao peso do busto inacabado no meu colo. O teu. Perde-se-me a mente em delírios febris à conta, já sem conta, das vidas passadas a esculpir-te.

E agora, obra acabada, orgulhosamente imperfeita, à minha imagem. Prostrado, subjugado, vaidosamente cansado, presenteio-te com a obra de uma vida.

Agradeces, amavelmente:
"Obrigada... mas agora não me dá jeito guardar isso lá em casa..."

Life

Missed crying myself to sleep.

Thank you life, for showing me that pain is temporary... but recurrent...
I kneel before you!