sexta-feira, 17 de junho de 2011

Hoje

Sigo-te, desajeitadamente, por entre estas ruas vazias de espaço. Não me escondo. Não me incomoda que me vejas pelo reflexo da montra que finges olhar. Continuo a seguir-te. Mais perto, agora.

Agarro-te pela cintura, sem sequer disfarçar, mesmo em frente à mercearia do Ezequiel. Vestes-te de uma surpresa ensaiada e ameaças gritar-me ao ouvido. Ignoro-te e ignoro o mundo que nos olha.

Arrasto-te para o primeiro vão de escada, ali, na esquina da livraria velha. Beijo-te à força, com força, até que a amostra da tua resistência se funda com o fogo da minha vontade. Rasgo-te a vergonha fingida em minúsculos pedaços de prazer, que mantenho entre os meus dedos que te agarram e a tua pele que me queima.

Percorro cada centímetro do teu pescoço, às cegas, às escuras, surdo aos teus mudos protestos. Encosto-te contra a parede, paredes meias, já sem meias, que só atrapalham. Murmuro-te ao ouvido, ordeno-te agora que não gemas, para que me ouças enquanto me chego. Aproximo-me...

Monto-te e desmonto-te, como uma caixa de legos despojada de instruções, perdidas entre as peças de roupa atiradas ao acaso e o suor que nos escorre do peito. Faço-te em figuras, que monto com as mãos e desmonto com a boca. Encaixo-me em ti, como derradeira peça de um puzzle agora completo, que te ilustra de costas voltadas, cabelos soltos e punhos cerrados em torno de nós.
Suplicas-me para que não pare.

Hoje não há verdade ou consequência.
Nem uma, nem outra...