domingo, 31 de janeiro de 2010

Sinal

A tua memória, vinda do nada, embateu em mim como se de um sinal se tratasse. Não falo de um sinal divino ou qualquer outra forma de crença sobrenatural. Não. Foi mesmo como um daqueles vulgares sinais de trânsito, em que batemos quando olhamos distraidamente a mini-saia que se passeia do outro lado da rua. Um desses. Banal, sujo, gasto.
Ainda assim, atirou-me ao chão...

Não me levantei de imediato, de tão compenetrado que estava na árdua tarefa de contar estrelas. Até os flashes que, na altura, confundi com sinais, não passavam de vulgares sinais de luzes dos carros que, desesperadamente, tentavam não me atropelar.
E, na sua maioria, conseguiram...

Já na ambulância, a caminho do Hospital, um outro sinal. Indistinto, quase inaudível, um ténue bip cadenciado abranda de ritmo até se alongar num único bip, contínuo, agora ainda mais longínquo, que se funde com as sirenes que já não ouço.
"... 3... 2... 1... AFASTAR!"

Estranho... será outro sinal?!?

segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

Fantoche

Hoje acordei com vontade de te beijar.
Senti o calor dos primeiros raios da manhã tocar-me o rosto ao de leve, tão de leve que pensei que fosses tu. Não. Era só o sol a despertar-me, como tu o ensinaste. Ainda assim, parecias-me tu.

Voltei-me para te beijar, para te mostrar à força de lábios o desejo que já não consigo esconder na pele. Quis beijar-te a boca e aninhar-me em ti, inebriado pelo teu cheiro. O teu. Só teu, sem aditivos ou corantes artificiais.
Voltei-me para te beijar e não te encontrei...

Provavelmente saíste mais cedo. Concerteza terias alguma reunião. Seguramente, ontem, no auge da antecipação, naquele segundo em que revês mentalmente todos os passos que ainda não deste e fazes aquelas covinhas no rosto que me dão vontade de te trincar, ter-te-ás esquecido de me avisar.
Honestamente, admiro a forma como tentas equilibrar a tua carreira e a tua vida pessoal. Tens sempre tanto para fazer...

Entro no chuveiro e deixo a água correr livremente pelo meu corpo, como se das tuas mão se tratasse. De olhos fechados, sinto o toque quente da tua língua percorrer-me o pescoço, o peito, todo o meu corpo. Ainda de olhos fechados, não consigo deixar de te tentar agarrar, enquanto escorregas por entre os meus dedos.
Abro os olhos e, juro, vejo-te ainda fugir pelo ralo da banheira...

Enfrento agora mais um dia sem ti, com horas que conto intermináveis e minutos que, cruel e irremediavelmente, adensam a saudade que te sinto. Arrasto-me até ao trabalho, sem resistir ao ímpeto de baixar a capota do carro e deixar que o teu sol me beije mais uma vez.
Sorrio, como sempre acontece no meu dia, com a memória de ti...

O regresso a casa é sempre complicado. A tua proximidade premente torna os minutos ainda mais longos e as filas de trânsito ainda mais insuportáveis. Debato-me nervosamente com os metros que me separam de ti, enquanto estes se transformam em quilómetros, com um evidente desrespeito pelas mais básicas regras do Sistema Métrico Internacional.

Entro em casa e largo apressadamente tudo que carrego no chão do hall, na ânsia de te ver, de te beijar. Corro para a cozinha, onde te encontras, onde finalmente te encontro. Agarro-te pela cintura e afogo-me nos teus cabelos enquanto te viro para mim.
- Pára - respondes-me. Não vês que estou a fazer o jantar? E vê lá se arrumas as coisas que deixaste espalhadas pelo chão da casa. Julgas que sou tua criada??

E eu, como sempre, obedeço-te. E arrumo.
Arrumo o casaco no armário do hall, descalço os sapatos e calço os chinelos que sempre me pedes, "para não sujar a casa". Arrumo o portátil no armário do escritório, na porta da direita, entre os meus livros e as tuas revistas, perfeitamente ordenadas. O embrulho, com o vestido novo que comprei para te dar, na hora de almoço de que abdiquei por não conseguir comer longe de ti, arrumo delicadamente em cima da cama. Pode ser que, desta vez, aprecies a surpresa.
E arrumo o meu amor na prateleira, ali, mesmo à mão, à espera de um bocadinho do teu...

Mas Amor, sabes meu amor, era só um pouco do que eu tinha para te dar?!?

domingo, 17 de janeiro de 2010

Meu Mundo

Digo-te ao ouvido, enquanto dormes,
Inquieto e agitado, que não te conformes.
O mundo e a vida seguem seu rumo,
Gritam teu nome em sinais de fumo,
Ordenam o caos em que sempre te arrumo.

Lembro-te, no sono em que te velo,
Os risos e abraços com que revelo
Um doce segredo, pedaço de mar,
Raiz do meu voto de jamais te largar.
Envolvo-te no escudo do meu abraço:
Nada, ninguém, nem tempo ou espaço,
Coisa alguma te vai magoar.
O Mundo é teu... e eu hei-de to dar!!

terça-feira, 12 de janeiro de 2010

Slow Motion Love

Vi-te chegar ainda antes de te ver.
Vi o eco dos teus passos desajeitados no silêncio da tarde e vi o doce aroma do teu perfume, que emanava já de mim. Vi-te, ainda a esquina não se tinha dobrado para ti.

Só podias ser tu.
Pelos olhares de desdém e os "havias de me ver com menos dez anos", que se soltavam à tua passagem. Pelas cabeças viradas, as cotoveladas apressadas e os "olha-me aquela", que se erguiam uns decibéis acima do desejado. Pelos "quando crescer quero ser assim" que se adivinhavam no pensamento das meninas que paravam agora de brincar no jardim.
Sim, só podias ser tu. Não precisei sequer de ouvir o som das travagens tardias ou os piropos foleiros, gritados do 5º piso daquele prédio em construção. Eras tu.

E eu, sozinho, naquele banco, a ver-me ver-te chegar.
Fiquei a observar-te de longe, com o teu vestido azul, que julgavas agradar-me. Tão doce era o teu sorriso quando o vestias, que nunca tive coragem de te dizer que o detestava. Gostava-te, porém.
Amava-te, até.

Vi ainda como te dobravas para apertar as sandálias, com a pose blasé de que te orgulhavas, indiferente ao impacto que a visão das tuas pernas, perfeitamente torneadas, pudesse causar nos transeuntes.
Meu Deus, como és bonita!

E eu, maltrapilho, triste farrapo de mim.
Como podia eu querer que me amasses?
Como pude eu crer que me amasses?

Aproximei-me de ti, lentamente. Não permitias tu que fosse de outra forma.
Sempre adorei esse teu jeito de sugestionar o tempo e envolver o mundo todo no teu pequeno carrossel em câmara lenta.
Beijei-te a boca, não tão demoradamente quanto gostava, mas na justa medida da nula resistência que te tinha. Sabias, hoje, ao que sempre soubeste e deixaste-me nos lábios um doce travo a primeira vez.

Foi então que ganhei coragem.
Tirei a mão do bolso, que encostei à tua testa enquanto te sussurrava um "Amo-te", quase inaudível.
As minhas palavras tiveram em ti o efeito de uma bala e caíste inanimada a meus pés.
Tal como sempre receei que fizesses, desapareceste, num segundo, da minha vida.

De repente, sem lembrete ou aviso sonoro, o mundo regressa à sua velocidade inebriante, que tudo consome e nada poupa. Olho para o relógio. "Merda! Estou atrasado para a minha consulta no dentista."

Adeus, meu Amor.
Beijo-te numa outra vida...

segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

Feast

I've killed the Dragon, slayed the Beast
Slaughtered the fucker and had me a feast.
Whose blood is this then?? - asked the Dragon to the dying man.



Empunhavas, seguro, o teu punhal.
Punho cerrado, braço estendido,
Pé recuado, escudo partido,
Pleno de força e vontade animal.

Acorrentada, numa laje ancestral,
Uma doce princesa, num choro sentido,
Recorda-te um sonho há muito perdido
E exulta os teus feitos em tom teatral.

Logo se avivam lendas de espadas
Cravadas na pedra, batalhas travadas
Com monstros azuis e dragões amarelos.

Estou farto de estórias de Fadas,
Dragões e Princesas encantadas...
Hoje é dia de derrubar Castelos!!