terça-feira, 17 de março de 2009

Coma

Acordo, lentamente.

Os meus olhos resistem à luz que os invade e os músculos parecem não querer responder. A boca, seca, procura o ar que a envolve, como se fosse esta a sua última inspiração.
Arranco os tubos que me rasgam o nariz e olho à minha volta. Tudo é paz. Tudo é silêncio. Uma calma anormalmente tranquila reina no ar.

A custo, abandono a cama articulada e dirijo-me para a janela.
Está um sol radiante lá fora. O céu aberto, sem nuvens, é o palco perfeito para a dança dos pássaros, com o seu doce chilrar.
As crianças brincam na relva e, entre elas, o vulto irrequieto do meu filho. Como cresceu...
Observo-o por breves momentos que me parecem horas. Estudo cada movimento, decoro cada gesto, absorvo cada segundo. E, num instante, naquela fracção de tempo em que o mundo parou, os nossos olhares encontram-se.
Já de olhos banhados em lágrimas, vejo-o correr em direcção à janela, de sorriso rasgado estampado no rosto. O meu sorriso...

Iço-o pela janela, com uma força que não sabia ter e dou por mim num mundo à parte. Surgidos não sei bem de onde, amigos e família envolvem-me num abraço que me sufoca de carinho. As flores ocupam agora todo o quarto e adivinham-se as perguntas no ar:

"Então, como estás?"
"O que sentiste?"

Engraçado que, até aí, não me tinha dado conta que tinha acordado...

Sorrio, docemente, enquanto respondo:
"Nem tudo é mau. Passa-se o dia inteiro a sonhar..."

Sorrio ainda mais, quando concluo em silêncio:
"Hoje, acordei... e mantenho os sonhos vivos em mim!"

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