quarta-feira, 20 de julho de 2011

Tau

Olho-te.
Estou com um tau que não te aguento - penso.
Penso-te. Imagino-te.

Imagino-te decadente Vénus de Milo, despojada de braços, pernas partidas pelo tempo meu, corpo agastado, arrastado, sujo e engelhado por vontade minha. Imagino-te Camões, sem um olho, sem pala, com palas. Duas. Imagino-te Capitão Gancho, enferrujado, enrugado, tolhido pela ruindade, à mercê de um tic-tac incessante. TIC. TAC. TIC. TAC.

Penso-te Bela Adormecida, sem Príncipe Encantado, para não mais despertares de um sono entorpecido, mergulhada nos constantes pesadelos que te invento. Penso-te Cinderela depois da meia-noite, sempre depois da meia-noite, sem sapato, semi-descalça, com frio, cansada, com sono, pelo sono que não te permito. Penso-te Medusa, com negras cobras no lugar dos cabelos brancos, enloquecida por um sibilar agudo e prolongado, que te grita impropérios meus.

Estou com um tau que não te aguento.
Penso. Alto. Talvez até to diga.

Olhas-me, perplexa, com cara de quem me vai perguntar de quem é a culpa. Ainda bem que não o fazes. Destesto anagramas.

"Vou tomar banho. Estou com um tau que não me aguento".

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